Acrescente a esse cenário, nuvens pretas carregadas se aproximando rapidamente, raios, trovões, chuva louca para "sextar" com vontade (afinal essa chuva é carioca). É claro que ela vai despencar com precisão, pontualmente na hora em que os cariocas ávidos por um sexta-feira sairiam do trabalho.
Acrescente a esse cenário uma pessoa que tem uma consulta marcada e que não pode perder. Não que ela seja do tipo que não cancela consultas para ir a um bom encontro com as amigas. Mas essa ela não pode perder, adiar, nem cancelar. Tem que ir.
Já prevendo a dificuldade de conseguir uma condução, mas como essa pessoa tem uma boa relação com São Longuinho, ela faz o seu pedido básico: São Longuinho, esquece a chuva um instantinho, deixa o céu de ladinho, foca na pessoa aqui que está te prometendo três selinhos se ela achar um "taxinho". Olha só São Longuinho, "prestatenção", fica ligado, vou pedir o táxi agora.
E não é que Vanderson está disponível e exatamente embaixo do prédio em que a pessoa se encontra?! São Longuinho cê é demais! A pessoa se despede com um "tchau povo, bom final de semana, tô indo na chuva "meRmo", e já sai pagando a sua promessa pra São Longuinho no corredor da empresa. Um passinho, um pulinho.
Desce o elevador e assim que entra no corredor de saída já avista o amarelinho com Vanderson dentro na porta. Tranquilidade no coração.
Assim que a pessoa está passando na catraca o carro de Vanderson começa a se movimentar lentamente para frente. Cabô tranquilidade! "Vanderson, me espera. Já estou aqui!", grita a pessoa desesperada.
Eis que a pessoa olha para a esquerda e identifica o motivo do deslocamento de Vanderson. Entre muitos trabalhadores que já deixaram suas mesas encolhidos embaixo de seus guarda-chuvas embaixo da marquise (é, pra carioca assim como biscoito O Globo foi feito para se comer na praia, guarda-chuva foi feito para ser usado embaixo da marquise), uma mulher sem medo de estragar a escova do final de semana, se lança no aguaceiro balançando as madeixas respingadas e fazendo com o dedo fino e longo aquele sinal obsceno de vem aqui meu taxista.
É nessa hora que a pessoa aquariana que se orgulha de não ser ciumenta, que está mais desalinhada do que gato sem bigode (esse é o motivo da consulta mesmo em dia de dilúvio carioca), se sente dominada por um sentimento de posse e se lança em performance atlética, pulando os degraus molhados e escorregadios da escada gritando: "Nããão Vaaaandersoooon, eu estou aqui! Vaaaandersoooon, você é meu! Fui eu que te chamei com a ajuda de São Longuinho. Você é meu, Vanderson!"
Neste momento as pessoas encolhidas embaixo de seus guarda-chuvas embaixo da marquise já começam a se esticar, se alongarem, procurarem um posição melhor para assistirem melhor a luta de mulheres na poça que está prestes a ter início. Poças essas que a dona do táxi, do taxista, de tudo, segue pulando e gritando: "Vanderson, você é meu! Pergunte pra São Longuinho!"
É então que o olhar da sedutora de taxista alheio em horário de rush em dia de chuva de verão no Rio de Janeiro encontra-se com o fervor do olhar da aquariana tranquilona nada ciumenta dominada pelo sentimento de posse e pelo pânico de ver o seu taxista escorrendo pelas mãos mais rapidamente do que a água da chuva escorre por seus cabelos.
É então que a sedutora lembra-se dos seus cabelos na chuva, da escova do final de semana sendo desfeita, larga a maçaneta do táxi e volta para a proteção da marquise.
A pessoa entra em seu táxi e Vanderson está rindo e diz aqui pelo Waze serei seu por 37 minutos. A sexta-feira de chuva de verão em horário de rush segue seu rumo sem briga de mulheres na poça por um taxista mas mostrando a sua força: é capaz de transformar uma aquariana altruísta em uma taurina possessiva.
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