Desejos que saem do fundo do subconsciente, como comer sanduíche de queijo com banana do Bob's. quando eu nem me lembrava que eu lembrava que isso existia. Devo ter comido esse sanduba no umas duas vezes na vida, no máximo. Mas em um desses quase 50 dias de quarentena eu acordei desejando estar em um fila enorme do Bob's, reclamando da lerdeza no atendimento, só para comer o queijo com banana.
Lembranças que pareciam completamente apagadas surgem vivas na cabeça e com imagens nítidas como eu criança bem pequena (tipo por volta 6 anos) entrando na casa da benzedeira Dona Chica em São Pedro d'Aldeia. Uma casa azul, com varanda de piso vermelho, vasos de plantas, cortina branca e ele usava uma tesoura para fazer a reza.
A Nostalgia está a flor da pele. Saudades de pessoas queridas, de coisas simples como estar embaixo de uma árvore, até de coisas esdrúxulas como andar na rua molhada pela chuva levantando aquela laminha que respinga na batata da perna e principalmente de momentos especiais como um piquenique no Parque Lage com amigas e filhos. Own... Sofia nem tinha nascido ainda.
Vontades de algo que nem sei bem o que é. Senti uma vontade muito grande de estar em um jardim. Com flores, verdes, bancos para sentar. Mas não sabia que jardim seria esse. Sabia que não era um jardim tipo Jardim Botânico, não era algo como um parque. Vontade de um jardim menor, mais aconchegante. Mas qual? Forcei a memória para me lembrar do tal espaço que agora eu sentia tanta vontade de estar nele. Seria um jardim de alguma casa da minha infância? Não. Mas também não era os jardins dos museus e Centro Culturais que já visitei, como jardim da Casa Roberto Marinho, Instituto Moreira Sales, Vizcaya Museum em Miami, Casa Rui Barbosa, Casa Firjan, do Museu da República, Museu do Açude que eu passeava pelo jardim com o meu pai, entre outros tantos.
Revisitei a minha memória para reconhece esse tal jardim que agora surgia forte como um desejo. Era um jardim de bairro, tipo um refúgio, algo que eu iria andando pela rua movimentada e de repente encontrava esse jardim. Algo tipo o Begijnhof em Amsterdam, mas não era esse. Seria um terreno baldio aproveitado pelos moradores e pensei em um jardim-horta que tem no Bairro das Laranjeiras, mas também não era.
Até que me lembrei do Jardin des Rosiers Joseph Migneret, no distrito de Marais, em Paris.
O Marais é um bairro movimentado, um bairro cult e modinha em Paris. Cheio de restaurantes, bares e cafés descolados, museus, manifestações artísticas, lojinhas. Esta no sexto e último dia de viagem em Paris. Eu, minha filha e minha mãe caminhávamos encantadas, porém cansadas pelo Marais querendo absorver tudo nessa despedida, mas ao mesmo tempo precisando de um refúgio. De um momento de calmaria. E de repente mais uma surpresa! Passando pela rue des Rosiers, uma rua de comércio, avistei uma portinha, no número 10 para ser mais exata.
Lá dentro uma área verde. Resolvi entrar e me deparei com um tipo de jardim secreto, Jardin des Rosiers Joseph Migneret.
Na verdade este paraíso verde de paz fora de vista, tão inserido e ao mesmo tempo tão afastado do burburinho urbano, este oásis verde no coração do Marais nasceu do encontro dos jardins privados de três belas mansões típicas do distrito: o Hôtel de Coulanges (atual Maison de l'Europe de Paris), Hôtel Barbes e Hôtel d'Albret.
Inicialmente denominado de Jardin Francs-Bourgeois-Rosiers, foi renomeado em 2014 Rosier Garden Joseph Migneret em homenagem professor da escola Hospitalières-Saint-Gervais desde 1920 e depois diretor em 1937. A escola municipal é vizinha ao jardim.
Joseph Migneret combatente ativo da resistência durante a Segunda Guerra Mundial, entre as nações que salvaram as crianças judias da deportação. Das crianças dessa escola 165 eram deportadas. Joseph participou ativamente do resgate de várias crianças.
O jardim é cercado por uma variedade impressionante de arbustos: bengalas da Provence, laranjeiras mexicanas e cornijas brancas.
Um local perfeito para uma parada estratégica para descanso e até para saborear um dos famosos Falafels (pão tradicional da culinária do Oriente Médio), que são oferecidos nos muitos restaurantes para levar localizados ao longo da rua.
Ou para uma leitura tranquila, um piquenique romântico ou momentos em família perto do playground.
Ali dentro, alheio ao movimento lá de fora, observando o entorno deste jardim, podemos ver as mansões burguesas do século XVII, a chaminé mais escondida do Marais e os restos de uma das 77 torres do Marais.
Deitada na minha cama, olhando para o teto e tentando reconhecer esse meu desejo de estar em um jardim em me lembrei do Jardin des Rosiers Joseph Migneret, um oásis no meio do burburinho do Marais. Um momento de relaxamento que tive com a minha mãe e minha filha na despedida dessa viagem.
Essas lembranças funcionaram como uma escapada dos pensamentos acelerados, dos sentimentos conflitantes, dos desejos não identificados que o confinamento, o momento de pandemia que vivemos provoca. Lembranças de um oásis que funcionaram como um oásis no meu dia.
Serviço:
Há duas entradas para esse jardim tranqüilo, pela rue des Rosiers, n° 10 e pela Maison de l'Europe de Paris, na rue des Francs-Bourgeois, n° 35-37. A estação de metrô mais próxima é o Saint-Paul.
Abertura do jardim:
Durante a semana - 8:00
Nos finais de semana e feriados - 9:00
Fechamento:
Horário de inverno até o final de fevereiro - 17:15
Mês de março - 18:00
1° de abril à 30 setembro - 19:00
1° de outubro ao início do horário de inverno - 18:00
Diário de viagem - Seis dias em Paris: